INCONSCIENTE

Introdução.

“Arte e Cosmos: o Inconsciente como Viageiro”, é o nome da tese que apresentei em 2003 para a faculdade de Belas Artes de Vigo.

O breve texto que segue é um roteiro da ideia inicial que queria desenvolver e como não tinha nenhuma referência para o meu enfoque para o aparecimento do universo, encaminhei a tese para os fundamentos da teoria do Big Bang.

Os primeiros pensamentos foram escritos no ano 2000 em Copacabana, Rio de Janeiro, vendo as areias da praia totalmente cobertas por pessoas vestidas de branco.
O ambiente zero do Novo Milênio.
Dois meses depois me hospedo no Hotel Glória sem saber que na habitação ao lado, Einstein tinha escrito anotações para sua palestra sobre a teoria da Luz. Fotografei seu quarto e acrescentei uma instalação com a autorização da direção do hotel. Uma fotocópia da sua conferencia, escrita à mão pelo físico, guardei com admiração e perplexidade até hoje.
Fernando Casás, 2017.
UMA HIPÓTESE DO INCONSCIENTE GERANDO UNIVERSO.
A acumulação da energia que procurava lugar produziria um espaço que se ia dilatando em função da sua necessidade até o ponto em que esta energia seria mais acelerada que a própria produção de seu espaço. Assim esta acumulação de energia se foi comprimindo gerando fricções e consequentemente uma inflação que se foi multiplicando exponencialmente. Chamamos a esta enorme energia de Inconsciente. A expansão do Inconsciente necessitava cada vez mais lugares que se fossem multiplicando em desdobramentos contínuos de lugares ou espaços que conhecemos como universo ou universos. Neste caso, o universo com dobradiças que possibilitavam replicantes como ondulações que se interpenetravam através de cópias espelho, percorria o universo que ia passando para os outros e esta vibração ou mantra unificava o equilíbrio da identidade da percepção da totalidade. Existia e funcionava como natureza.

A acomodação das partes mais ativas e alteradas pelas constantes fricções foram gerando infinitos espaços de sintonia com subjetividades afins; continuaram com as recepções da inteligência que gerava a totalidade do Inconsciente e consequentemente friccionavam estados já tocados anteriormente pela centelha da luz, produzindo assim um comportamento radical de si mesmo.

A matéria adquiriu natalidade da matriz que nos momentos da origem era atração e sexualidade infinita. Várias formas se mantiveram estabilizadas e conectadas com a memória da origem primordial.

Nestes momentos começavam a se fixar os arquetipos dentro das variáveis qualitativas em função da subjetividade do Inconsciente, que recebia e incorporava informações sobre sua própria inteligência.
Momentos que ficarão guardados como referência cósmica, com o cosmos que se estava construindo.
O arquetipo se transformou em marca permanente auto referida. Tudo foi sincronicidade em tudo e no todo, pois participava na convulsão de conhecimentos, fricções e singularidades.
O tempo que se estava formando foi presente absoluto, presenciando seu futuro e passado por sua potenciada potência. Foi um momento implosivo de dobradiças de presenças e acontecimentos, um momento interno e externo que se modificava, através da impossibilidade de controle do ambiente friccionado construído pelo poder do Inconsciente.

Seria consequente que se admita que a obra de arte que chega a transcender possa acontecer somente dentro do insano, dentro do delírio, porque unicamente neste espado se apresentariam as condições para o contato direto com o Inconsciente.
Recorrendo a William Blake, de que conheceremos o infinito abrindo as portas da percepção e mais além, a aniquilação da cordura conduz ao contato com o Inconsciente. A totalidade da natureza em estado terminal, absoluto, é uma situação que se deflagra quando o médium conecta o Inconsciente com a percepção ordinária.
Uma ponte de conexão entre o indescifrável e a razão, entre o caos e a regra. A compreensão da obra de arte passa a dar à obra uma leitura deste mundo, uma leitura ruidosa e vulgar por ser compreensível. No princípio era um lugar vazio, talvez simpático ou acolhedor para onde se dirigiam e se acumulavam Inconscientes.

A energia se foi acumulando em regiões de concentração, e como consequência se viraria para dentro, se dobraria em curva perimetral de desequilíbrio-equilíbrio.
O que estava dentro estava fora se auto regulando.
As fricções eram aceitas e potenciadas e o todo absorvia as subjetividades da ação.
Esta energia contagiaria o seguinte núcleo de Inconsciente já saturado e tudo começou a se incorporar e digerir em cadeia e gerar fosforescências. Vários núcleos de Inconsciente se misturaram em um espaço já infinito, de maneira que aqueles núcleos de Inconsciente atingidos, contaminados, continuaria hoje em processo de incorporar outros núcleos de inteligência.

Por ondulações de contaminação, os espaços que não estavam preenchidos pela totalidade começaram a construir conexões da totalidade geral, de maneira que os núcleos mais distantes, já conectados, transferiam aos inícios da origem sua adesão, participando na incorporação de mais conhecimentos de outras informações. Tudo era inteligência, existia só inteligência. Com isto proponho que o Inconsciente se alimentaria de inconsciente, gerando uma modificação constante do conhecimento infinito.

As particularidades do Inconsciente se construiriam a si mesmo, brotariam do Caos que sentia.
Se comprimia e respirava em uníssono de atravessamentos que seguiam acoplando entre si uma neblina que não contém água, partículas, umidade. Seria uma neblina desprovista de neblina, se acumularia em um espaço fabricado por ela a medida que se expandia nas flutuações adaptáveis, uma poeira sem pó em alta velocidade.

Ambiente mais que espaço para definir as condições de relação entre todas e qualquer parte que ocupasse o espaço. Tudo estaria ambientado, interligado, conectado e fundido em amplitudes no sentido de mais e menos potência. Maior e menor eram decorrentes do ambiente que, por sua vez, seria consequência da natureza do Inconsciente, como uma bola de soprar de aniversário sem invólucro; o que estava por igual dentro e fora poderia ser mais pressionado de um lado que do outro, mas tudo ficaria igual dentro e fora, coesionado, sem identificação.

Tampouco havia uma direção ou atração. À medida que se expandia o Inconsciente, o espaço se expandia com ele, sendo duas entidades reprodutivas em uma só.

A aglomeração de núcleos de intensidade variável apresentava descargas de fricção produzindo estados mais concentrados relacionados com a matéria, assim aparecendo objetos que atravessavam as vibrações do Inconsciente. Estes pedaços de matéria seguiam impregnando o Inconsciente circundante que ocupava o espaço e assim se recargaria de energia e volume aumentando suas dimensões até colisionar com outra matéria que tinha passado pelo mesmo processo. Desta maneira Inconsciente expandiu e multiplicou a matéria. Quanto mais matéria mais colisões, mais matéria.
Matéria e Inconsciente ocupariam o mesmo espaço, já que toda a matéria tinha Inconsciente porque os objetos nasciam da mesma matriz. Assim apareceu o tempo sempre no presente, algo que acontecia no instante presente e se repetia como presença.

Inconsciente conheceria os resultados antes de acontecer, uma colisão ou choque seria conhecido em todos os detalhes antes de acontecer, uma situação múltiple onde os diferentes aparecimentos estavam construídos antes de acontecer, criando um campo de possibilidades localizadas em realidades cotidianas antes, durante e depois de acontecer. Esse conhecimento manejado pelo Inconsciente construiria iguais, ocupando espaços independentes e multiplicados.

Em cada universo habitavam matérias iguais construídas pelo pensamento do Inconsciente, como se a imagem que podemos ver no espelho existisse antes, durante ou depois que passássemos diante dele, porém com particularidades de presença independente para poder modificar-se.

O universo assim construído não teria sentido fora ou dentro da complexidade como leitura da natureza, se não fosse natureza. Assim é como se comportaria cada natureza, como age e existe, Quando a realidade real chega demasiado diluída até nós, nos ordenamos, não há sintonia com a intensidade do Inconsciente gerador, apareceria a racionalidade e pouco chegaria a transcender.

As primeiras colisões com a luz formariam espectros da matéria inacabada, fantasmas.

Se não colisionassem outra vez, ficariam à deriva, sendo somente matéria sem forma definida.

Os conceitos da teoria do Big Bang apresentam uma parte sobre a questão da matéria e da energia escura. Porém Inconsciente deve ser considerado como força mais potente que a matéria e a matéria escura seria singularidades durante a metamorfoses unificadora que se mantiveram em adaptação para sua sobrevivência e necessidades. O fundamento da energia escura seria a matéria escura não atingida pela luz, petrificações de um momento de ruptura.

Este Inconsciente total e abrangente e algumas particularidades referidas à auto sobrevivência equilibrariam o universo através da subjetividade onírica.
O universo como entidade infinita teria infinidade de conhecimentos e inteligências antes do princípio, que acumularia flutuações, pensamentos, que resultariam na formação do Inconsciente, uma organização parecida à sincronicidade porque a natureza já seria conhecedora de si mesma antes de existir.

As ondulações do Inconsciente seriam emanações da inteligência antes da inteligência, isto é, antes do Inconsciente constituído. O ambiente de aproximação das ondulações aconteceriam em lugar nenhum, tudo estaria conectado e disperso por igual como energia replicada ao instante.

Isto levaria a um caos dinâmico porque haveria intenção de inteligência buscando inteligência, criando um sistema de propagação e contaminação imediata como quando duas gotas de água se atraem e se tocam ativando a união.
Não aconteceria no campo da matéria mas sim dentro do etéreo, do gás, da nuvem, emanações vindas de outras ou auto geradas.
Isto abarcaria todo o espaço que se auto gerava, porque era uma necessidade da própria inteligência do Inconsciente poder gerar espaço e assim esta concentração se engoliu sem controle, e passaria para dentro do seu interior o que possibilitaria uma expansão em cadeia.

Esta disfunção produziria matéria, estados limites além da fricção. A matéria em estado de transformação imediata implodia fragmentando-se. O espaço necessário para o Inconsciente ocupar sensibilizou mais entidades de diversos fluxos de sensibilidades.
Isto seria tudo que temos e somos, visitados por formas e singularidades, que não são as mesmas entre si.
Outros corpos seriam semeados continuamente através da sua permeabilidade e seriam agentes construindo matéria e energia com intenção de continuidade.
Inconsciente seria uma totalidade única, ramificada em subjetividades de diferentes alteridades.
As emanações teriam comportamentos subjetivizados pelo entorno. As emanações do Inconsciente agiriam de dentro para fora, afim à personalidade do objeto irradiando uma membrana pulsante que estaria conectada com a recepção da totalidade.

O processo de acomodação e aceitação dos novos níveis de Inconsciente que se iriam incorporando ao Inconsciente existente se faria quando surgisse outro elemento que esteve depositado no interior da matéria.
Por acúmulo se desprenderia reverberação que é obrigada a se liberar e sair do seu interior, e passaria a fazer parte do seu entorno incluída na totalidade externa.
Este espaço estaria interconectado instantaneamente com os espelhos do Inconsciente. Quando coincidissem espelhos paralelos, a ação aconteceria como um túnel dentro de outro, amplificando sua reprodução.

Nada deixaria de ser detectado. Antes da primeira ação, do primeiro objeto, do primeiro pensamento, o Inconsciente estaria presente.
A energia do Inconsciente se expanderia à medida que necessitasse de ambiente onde ele ia gerando seu próprio espaço para ser ocupado por essa energia ou emanação, e esta fabricação de espaço faria com que se produzissem convulsões e situações que alterariam a ocupação continua pelo Inconsciente e assim esse campo se ampliaria continuamente.
Isto permitiria mais Inconsciente até completar a complexidade do nada, e assim o ambiente voltaria a estabilizar-se em um sistema linear, acrescido de outras subjetividades que iriam sendo ramificadas dentro do todo.

As partes do Inconsciente que não chegariam a entrar no túnel por uma identificação com a atração, formaria um bloco de energia concentrada sem possibilidade de dissolver-se como massa, passando a existir como fantasma dessa massa. Seriam focos à deriva que manteriam sua concentração de Inconsciente que poderia chegar a ser dissolvida, manter-se ou aumentar em função da necessidade subjetiva da inteligência que desejasse como sistema de sobrevivência, funcionar como detentora do início e passar para a possibilidade do túnel.

Conheceria esse instante de transformação antes e depois, agindo como presente contínuo.
Por outro lado, a matéria escura ocorreria pela fragilização da energia escura. Seu ambiente seria maior que o da energia escura, com menos ramificações associadas à totalidade do Inconsciente.

O poder seria o Inconsciente, e a matéria seria a cristalização mínima de uma mínima parte da matéria escura que por sua vez também seria Inconsciente. Assim uma pedra encontrada no planeta Terra pertenceria ao planeta que pertenceria à matéria escura que pertenceria à energia escura que pertenceria ao Inconsciente.

Assim a pedra teria matéria e Inconsciente e a sua parte que conhecemos como consciente seria um estado menor, algo que se permitiria forjar com a função de unificar a natureza.

Nas regiões de maior atividade e concentração, a fricção entre energias produziria nós de energia e destelhos de luz e esta maior claridade diminuiria segmentos de planos compostos formando espelhos que se iriam despotenciando e se uniriam para uma estrutura mais potente.

Sendo Inconsciente a matriz de todas as possibilidades e impossibilidades, esta última entendida como fator absoluto e emocionalidade do Inconsciente seria a experiência de nascer e morrer continuamente, porque a intensidade e diversidade das emoções seria infinita.

O objeto se incorporaria através da energia pertencente ao Inconsciente e, nesta troca para manter-se ativo, produziria um processo de auto-referencia ou consciência que atravessaria a parte exterior e interior, conectando-se assim com o espaço e sua totalidade, e a totalidade seria o próprio objeto.

Assim, com esta presença do todo no todo e vice-versa, o objeto transcenderia, viajaria para a totalidade. Esta transmutação seria a compreensão total do objeto que deveria da obrafundamentar a função da obra de arte. Absorver o explicável e transformá-lo em inexplicável, sabendo que o inexplicável pertenceria à não codificação do que é apreendido. Percebido dentro da intuição, substituiria a visão ordinária que vê uma parte do objeto somente.

Falar com o Inconsciente ultrapassaria o diálogo primário em intenção de conteúdos e conhecimentos, porque derivam para o consciente a possibilidade ou estratégia para a compreensão.
Falar através da consciência reduz estar no Inconsciente. Parece mais fácil porque o consciente falaria depois do Inconsciente, e esta operação continuaria falando da impossibilidade de falar da transcendência.

A transcendência na obra de arte seria a intenção de relacionar-se através de sua subjetividade com o início da origem.
O objeto viveria a experiência do todo como particular que é, ao mesmo tempo, totalidade.
A morte deste seria um nascimento cósmico.
Inconsciente absorveria, difundiria e se equilibraria, incorporando mais Inconsciente e, consequentemente, mais ambiente, mais infinito. O universo como matéria seria uma entidade secundária nas infinitas particularidades e complexidades a serem construídas.
Seriam possibilidades de comportamento não concebido. O universo como Inconsciente seria a origem sem que houvesse origem e a matéria, uma diminuta criação do Inconsciente, uma matéria a posteriori refletida no observável que por sua vez não seria realidade.
Inconsciente diria que não há realidade, tudo seria um estar mutável do Inconsciente como a possibilidade de poder estar antes de estar.

Matéria escura e energia escura pertenceriam a variáveis criadas por uma das matrizes do Inconsciente.

Inconsciente no nada. Desejo e consumação para o momento das sincronicidades.

Os buracos pretos seriam núcleos dispersos de Inconsciente onde, por sua natureza de alta fricção, se conectam com a totalidade da auto-implosão por suas características de singularidades subjetivas, iniciadas através das sincronicidades.
Seriam a intenção de ser aceitos pelo Inconsciente total e poder dissolver-se, deixando de ser núcleo de alta fricção.

O planeta Terra seria a matéria que, não encontrando espaço gerado pelo Inconsciente, formou nós de energia não expandida, matéria escura, que foi captando subjetividades do Inconsciente até construir consciência que, para sobreviver, se iria auto regulando.

A Terra seria matéria com consciência que dialogaria com o Inconsciente.
A energia escura seria o equilibrador para que singularidades, subjetividades, pudessem passar a serem absorvidas pelo Inconsciente total.

Estas percepções foram presenciais, pois todos estávamos alí.

Fernando Casás.
Nigrán, 2004.